A lei ocupa a primeira parte do Antigo Testamento por ser a parte mais antiga das Escrituras Sagradas e devido a seu caráter peculiar como fundamento de toda a literatura bíblica. Todos os livros históricos, proféticos e poéticos do Antigo Testamento apontam retrospectivamente para a lei de Moisés "como tipo de fonte principal [que] assume a existência não meramente da lei em si, senão de um livro da lei, com o caráter e forma precisos dos cinco livros de Moisés" (KEIL & DELITZSCH, 2008). Aqui,história é também lei e profecia, com implicações teológicas e significados espirituais profundos.
Deus manda Moisés ficar no monte para ali lhe dar as "tábuas de pedra, e a lei, e os mandamentos que tenho escrito, para os ensinares" (Êx 24.12). Uns acreditam que os termos "lei" e "mandamentos" sejam sinônimos que indicam o conteúdo das tábuas de pedra. Uma tradição rabínica interpreta que se trata do Decálogo e de leis adicionais. Mas só os Dez Mandamentos foram escritos em duas tábuas de pedra pelo próprio Deus (Dt 4.13; 5.22; 10.2-4). As outras partes da lei foram ditadas por Deus e escritas por Moisés (Êx 17.14; 24.4; 34.27; Dt 27.3, 8; 31.9). Aqui temos os primeiros escritos da lei que envolvem os Dez Mandamentos e a instrução sobre a construção do tabemáculo (Êx 31.18), bem como sua execução até o final do livro, incluindo a interrupção dos capítulos 32-34, que relata o culto do bezerro e a restauração do povo. Mas, a revelação prossegue até o livro de Levítico (Lv 27.34).
A lei é identificada na Bíblia Hebraica como sêpher ha-torãh,' "o livro da lei" (Dt 31.16; Js 1.8); ou simplesmente ha-tôrãh,2 "a lei" (Ne 8.2, 7,13). A palavra "Torá" significa basicamente, "instrução, ensino, lei" e aparece no Antigo Testamento com o sentido mais amplo de coleção ou sumário de instrução, código de lei (Êx 24.12; Dt 1.5) ou regra particular (Êx 16.4). O termo se aplica também a norma ou instrução meramente humana (2 Sm 7.19) e ainda como instrução dada por humanos para a educação na literatura sapiencial (Pv 1.8; 3.1; 6.20). Esse vocábulo é usado no plural: "Estes são os estatutos, e os juízos, e as leis que deu o SENHOR entre si e os filhos de Israel, no monte Sinai, pela mão de Moisés" (Lv 26.46). O plural, tôroth, "leis", aparece aqui em relação à lei de Moisés. A lei é uma só; não existe mais que uma lei. O plural aqui diz respeito às várias prescrições rituais: Esta é a lei do holocausto (Lv 6.9 [2]);3 "E esta é a lei da oferta de manjares" (Lv 6.14, [7]); "Esta é a lei da expiação do pecado" (Lv 6.25 [18]); "E esta é a lei da expiação da culpa" (Lv 7.1). Veja ainda Lv 7.11; 11.46; 12.7; 13.59; 14.57; 15. 32; 18.4.
O termo torah vem do verbo (ÍTT - yrh) ou hôrãh,4 na sua forma flexionada, que indica "instruir, demonstrar, ensinar" (Êx 24.12). Trata-se, portanto, da instrução de Javé para o seu povo Israel, do guia para o bem-estar de toda nação. Ainda hoje a Torá está adaptada para ensinar a Igreja e os povos. Ela é chamada de "lei do SENHOR" ou de Javé (2 Cr 17.9; 34.14; Ne 9.3) e também de "lei de Moisés" (Js 8.31; 2 Rs 14.6; Ne 8.1), pois foi o grande legislador dos hebreus quem promulgou a lei como mediador entre Deus e o povo.
Segundo Keil & Delitzsch, a divisão da lei em cinco partes, Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, não foi obra de algum editor realizada posteriormente, mas está fundamentada no plano completo do Pentateuco que deve ser considerado original. O waw conjuntivo, ou seja, a conjunção "e" em we’êleh shemôth, "e estes são os nomes" (Êx 1.1), e em wayyiqrã’,6 "e chamou" (Lv 1.1), une esses livros um ao outro, formando uma unidade literária. Os três primeiros livros mantêm a seqüência histórica linear. A revelação do Sinai termina em Levítico 27.34. Os relatos do livro de Gênesis são de natureza teológica e profética, e sua história é considerada "Torá", instrução.
A estrutura essencialmente legal se concentra entre Êxodo 20 e Levítico 27, que Moisés sumariou da seguinte forma: "Estes são os mandamentos que o SENHOR ordenou a Moisés, para os filhos de Israel, no monte Sinai" (Lv 27.34). O livro de Números é o registro das jornadas no deserto, e Deuteronômio é o discurso de recapitulação sobre os quarenta anos de peregrinação no deserto que Moisés apresentou quando estava na fronteira da Terra Prometida. R. K. Harrison afirma que o termo "Torá" passou a designar todo o Pentateuco posteriormente ao exílio.
Pentateuco é o termo alternativo empregado para identificar a Torá como os cinco livros de Moisés. O termo vem de duas palavras gregas: pente,7 "cinco", e teuchos,s de significado amplo, como "vasilha, recipiente, urna para voto, livro". A ideia original era de instrumento, e com o tempo veio a ser usado para designar o estojo de levar rolos de papiros. Acredita-se que os judeus helenistas de Alexandria, no primeiro século d.C. empregavam o termo pentáteuchos,9 que corresponde a expressão talmúdica chãmishãh chumeshêy-torãh,w "os cinco quintos da lei". O vocábulo "Pentateuco" aparece em Tertuliano (Contra Marcião, Livro 1, 10.7) e em Orígenes, em seu comentário sobre o evangelho de João, mas logo depois disso se tornou usual entre os cristãos para designar os escritos de Moisés.
Pr. Ezequias Soares
Nenhum comentário: