O Decálogo é identificado no Antigo Testamento pela expressão hebraica ‘ãsseret haddevãrim,11 literalmente "as dez palavras". O termo só aparece três vezes na Bíblia, no Pentateuco (Êx 34.28; Dt 4.13; 10.4), traduzido por "dez mandamentos" em nossas versões, exceto na ARA (Êx 34.28). É identificado também como "estas palavras" que Javé falou (Êx 20.1; 34.27; Dt 5.22) ou ainda "as palavras do concerto" (Êx 34.28). Estas dez palavras estão esboçadas em somente dois lugares na Bíblia, no Pentateuco (Êx 20.1-17; Dt 5.6-21). Há 17 variações no texto de Deuteronômio em relação ao Decálogo do livro de Êxodo, mas isso não altera o sentido da mensagem. Muitas delas serão explicadas no estudo específico de cada um desses mandamentos.

A Septuaginta optou por traduzir dekalogos,12 “decálogo", a partir de dois termos gregos: deka,13 "dez", e logos,14 "palavra". O termo nunca é citado no Novo Testamento em sua totalidade e os mandamentos não aparecem de acordo com a seqüência canônica (Mt 19.18, 19; Mc 10.19; Lc 18.20; Rm 13.9). O Novo Testamento, às vezes, se refere a ele como "mandamentos" (Mt 19.17; Ef 6.2). Após a Septuaginta, o termo "decálogo" só aparece no período da patrística, na Epístola a Flora, de um autor gnóstico chamado Ptolomeu, que viveu na segunda metade do séc. II., e depois em Irineu de Lião, na forma latina (Contra as Heresias, Livro IV. 15.1; 16.4), e também em Clemente de Alexandria (em sua obra Pedagogos III. 12). Depois disso, o termo se popularizou entre os cristãos.


O Decálogo é a única parte do Pentateuco escrita "pelo dedo de Deus" (êx 31.18), linguagem figurada que, segundo Agostinho de Hipona, indica "pelo Espírito de Deus" e, de acordo com Clemente de Alexandria, "pelo poder de Deus". É também a única porção da lei que Israel ouviu partir da voz do próprio Deus no monte quando ele transmitia essas dez palavras (Êx 19.24, 25; 20.18-20). Os demais preceitos foram transmitidos por Javé exclusivamente a Moisés.

Existe uma discussão acalorada sobre Êxodo 34.28: "E esteve Moisés ali com o SENHOR quarenta dias e quarenta noites; não comeu pão, nem bebeu água, e escreveu nas tábuas as palavras do concerto, os dez mandamentos". Parece que o sujeito do verbo "escrever" é Moisés, mas o texto deve ser interpretado à luz do contexto. "O sujeito do verbo é ambíguo" (CHILDS, 1976, p. 604). Pode ser Javé ou Moisés, mas parece tratar-se do próprio Deus (Êx 34.1). Por essas duas peculiaridades, o Decálogo se reveste de um valor especial no Pentateuco, mas para o cristianismo tem o mesmo valor que qualquer outra parte do Antigo Testamento como Escritura inspirada por Deus (2 Tm 3.16).

As dez palavras foram escritas pelo próprio Deus em ambos os lados de duas tábuas de pedra, e entregues a Moisés (Êx 31.18; 32.15, 16; Dt 4.13; 5.22; 10.2-4). Os judeus, desde Fílon de Alexandria até a atualidade, dividem os Dez Mandamentos em dois grupos de cinco, um grupo para cada tábua. Agostinho de Hipona supunha haver três mandamentos na primeira tábua e sete na segunda. Calvino e muitos da atualidade acreditam que na primeira tábua estavam gravados os quatro mandamentos relativos aos deveres do homem com Deus e, na segunda, os seis mandamentos relativos ao homem e seu próximo. Alguns interpretam que o Senhor Jesus Cristo sintetizou as tuas tábuas nos dois grandes mandamentos (Mt 22.34-40), com a ressalva do sábado, pois não há ensino no Novo Testamento para a observância do quarto mandamento. Essa questão é discutida mais adiante, no Capítulo 5.

As dez palavras foram dadas a Israel logo após a libertação dos israelitas do Egito e se aplicam primariamente aos hebreus, não a toda a humanidade. Isso fica muito claro na expressão "para que se prolonguem os teu dias na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá" (Êx 20.12; Dt 5.16), que diz respeito à terra de Canaã. E o quarto mandamento, na recapitulação em DeuteronÔmio, afirma “porque te lembrarás que foste servo na terra do Egito e que o SENHOR, teu Deus, te tirou dali com mão forte e braço estendido; pelo que o SENHOR, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia de sábado" (Dt 5.15). O sábado legal era o sinal do concerto entre Javé e o seu povo Israel (êx 31.13, 17). São peculiaridades do sábado no sistema mosaico que o Senhor Jesus e seus apóstolos não incluíram como parte obrigatória na fé cristã.

Matar, adulterar, furtar e proferir falso testemunho já existiam nos códigos mesopotâmios e do Egito como crimes, embora os fundamentos e propósitos fossem diferentes dos revelados na lei de Moisés. Os hebreus do período Pré-Sinai sabiam que era errado desonrar a Deus pelo uso impróprio do seu nome, como era igualmente errado faltar com o respeito aos pais e cobiçar a propriedade alheia. Mas com a revelação do Sinai eles tiveram uma compreensão mais ampla desses mandamentos e passaram a entender que não se tratava de meras normas jurídicas, mas da vontade de Deus. Foi Javé quem colocou a lei no coração e na mente de todos os seres humanos, dando-lhes assim as condições necessárias para discernirem entre o certo e o errado, por meio da consciência (Rm 2.14-16). O concerto do Sinai mostra a origem divina de todos esses mandamentos.

A lei de Moisés não se restringe às dez palavras. O apóstolo Paulo se refere a ela como um livro, e não como as tábuas de pedras: "Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las" (G1 3.10). Trata-se, portanto, do Pentateuco, pois ele não disse: "nas tábuas de pedras dessa lei". O Decálogo é parte da lei, e não a própria lei em si mesma. A declaração: "Porque a lei foi dada por Moisés" (Jo 1.17) refere-se a todo o Pentateuco, pois mais adiante é dito que Moisés escreveu acerca do Messias na lei (Jo 1.45).

Quanto à divisão do decálogo, os católicos romanos e os luteranos seguiram o modelo de Agostinho de Hipona, que foi mantido durante a Idade Média. Os dois primeiros mandamentos, "Não terás outros deuses diante de mim e "Não farás para ti imagem de escultura... Não te encurvarás a elas" (Êx 20.3-5; Dt 5.7-9), são considerados um só mandamento (o primeiro), ao passo que o décimo é dividido em dois: "Não cobiçarás a casa do teu próximo" e "Não cobiçarás a mulher do teu próximo" (Êx 20.17). Nós seguimos o sistema das igrejas reformadas, que vem dos judeus e é anterior a tudo isso (JOSEFO, Antiguidades Judaicas, Livro 3, 4.113, edição CPAD).

Pr. Ezequiel Soares

Sobre Unknown

Edilson Pereira é pregador do Evangelho há 20 anos, tendo ministrado a Palavra de Deus em vários estados do Brasil. O mesmo é Professor de EBD, Escritor e Blogueiro.
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